Apresentado no apagar das luzes de 2022 por deputado que não renovou o mandato, projeto de lei argumenta que a profissão dispensa conhecimento técnico. Proposta que sequer foi distribuída a comissões da Câmara deve ser descartada pelo Parlamento sem mais perda de tempo.
O deputado Tiago Mitraud (Novo/MG), que não renovou seu mandato para a legislatura que se inicia neste ano, apresentou em 22 de dezembro, ou seja, no apagar das luzes do ano e de sua atuação na Câmara, um projeto de lei realmente surpreendente. A proposta teria o objetivo de revogar e alterar leis e decretos “a fim de desregulamentar profissões e atividades que não ofereçam risco à segurança, à saúde, à ordem pública, à incolumidade individual e patrimonial”. Entre essas, ele inclui áreas da saúde e, inacreditavelmente, a engenharia.
A proposição abrange no rol das dezenas de regras ordenadoras a serem eliminadas, sem qualquer debate com a sociedade ou as categorias atingidas, o Decreto-Lei 8.620/1946, que dispõe sobre a regulamentação do exercício de profissões de engenheiro, de arquiteto e de agrimensor, e a Lei 5.194/1966, que regula o exercício das profissões de engenheiro, arquiteto e engenheiro agrônomo.
Causa perplexidade imaginar que um parlamentar realmente acredite que o exercício da engenharia não requer formação específica. Mais ainda, na visão do deputado, a regulamentação seria mera reserva de mercado àqueles que simplesmente cumprem exigências burocráticas. Ou seja, os anos passados na faculdade de engenharia, os inúmeros cursos de pós-graduação e extensão, além do esforço de atualização tecnológica num setor cada dia mais dinâmico, assim como o acervo técnico acumulado pelo exercício profissional, são reduzidos a papelório sem valor.
É de se indagar se o deputado realmente gostaria de viver num mundo em que pontes, viadutos, estradas, prédios, infraestruturas de energia, saneamento e gás, para falar apenas de itens mais óbvios, fossem feitos por pessoas não qualificadas para tanto, valendo-se tão somente de sua boa vontade.
A engenharia, a exemplo de outras profissões, é regulamentada para assegurar à sociedade que suas atividades sejam desempenhadas de acordo com o maior rigor técnico possível. Coibir o exercício ilegal por leigos ou maus profissionais que não cumpram as regras é um imperativo para garantir segurança e bem-estar aos cidadãos. Exatamente por isso os que escolhem o ofício estão sujeitos a fiscalização e são responsáveis perante a lei pelo trabalho que desenvolvem.
Certamente cabe o debate sobre a atualização da legislação do engenheiro à luz dos avanços da profissão nesses quase 60 anos de vigência da lei, assim como se reivindica mais eficiência ao funcionamento do Sistema Confea/Creas. O que não está na pauta, absolutamente, é inaugurar o “salve-se quem puder” na engenharia brasileira.
Sob monitoramento da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) desde que foi apresentado, o PL em questão não teve qualquer movimentação e ainda aguarda despacho da mesa diretora da Câmara – em recesso até 1º de fevereiro – às comissões temáticas, que só devem se reunir em março próximo. Estamos atentos e vamos atuar fortemente para que a proposição não prospere e seja descartada sem mais delongas pelo Congresso.
*Por: Murilo Pinheiro – Presidente da FNE