Houve uma época que a ciência resolvia problemas e se detinha a apresentar soluções efetivas para o bem da humanidade e, naquele tempo, parece que não tinha medo de compartilhar resultados ao somar intensamente as várias sugestões advindas de diferentes frentes. Mas, na atualidade tem mostrado que não mais consegue assim se comportar.
Talvez os ditos “cientistas” atuais tenham elitizado a ciência de tal forma que não mais é possível à ciência permanecer no nível básico da solução dos problemas e anda se metendo demais em cearas que não lhe diz respeito como nos campos da política, por exemplo.
A ciência (estranhamente) começou a se preocupar demais com teorias. Tudo tem que ser teorizado para virar páginas e mais páginas de dissertações de mestrado ou de teses de doutorado. A solução efetiva de problemas do mundo real, de repente, perece não ser preocupação da ciência haja vista não constituir a garantia da obtenção segura dos títulos acadêmicos tanto perseguidos.
Assim, a ciência prioriza o desenvolvimento de teorias que possam ser documentadas em artigos ditos científicos e não pode se debruçar (totalmente) sobre soluções necessárias para a melhoria da vida das pessoas (na maioria das vezes, é claro; pois sempre existem as importantes exceções). Em geral, inventam-se problemas irreais e buscam-se (absurdamente) perguntas para respostas que foram sistematicamente construídas.
Exageros? Pode ser. Não é bem assim? Até talvez. Mas, os fatos estão aí para serem avaliados. Uma pandemia quebrou as pernas dos sistemas científicos de todo mundo. Não se conseguiu em mais de um ano soluções efetivas para sequer contornar as crises geradas pela Covid-19 sejam elas diretamente relacionadas ou indiretamente impostas. Não há ainda uma vacina isenta de dúvidas e nem tão pouco se consegue afastar temores quanto à eficácia das mesmas. Controvérsias das mais variadas em torno de eventuais medicamentos para conter a doença aparecem por todo lugar. Milhões morreram e a ciência dos gabinetes nada pode fazer de concreto para evitar que novas mortes ocorram.
Máscaras de todos os tipos foram produzidas aos bilhões. Concertaram-se alguns milhares de respiradores antigos e reproduziram-se (copiaram-se) as tecnologias de outros equipamentos já há muito existentes. Bilhões de litros de álcool em gel 70 foram produzidos. E o que mais? Algo de inovador foi produzido pela ciência para salvar vidas? Os cientistas foram a campo para tentar mitigar de forma inovadora os inúmeros problemas gerados? Parece eu não.
Não fossem as soluções que bem antes da pandemia as tecnologias já haviam gerado o caos seria completo, arrasador e ainda maior.
Sim, as tecnologias “seguram as pontas” (como sempre) e evitaram que os desastres fossem ainda mais intensos e destruidores. As mesmas tecnologias com as quais a ciência (na maioria esmagadora das vezes) não se permite trocar ideias ou se associar em projetos efetivos de parcerias para gerar conhecimento útil que se preste à melhoria de vida das pessoas (ou mesmo, para apenas salvar vidas).
Não se pode deixar de observar que algumas equipes de profissionais das universidades se mobilizaram para organizar campanhas para arrecadar cestas básicas de alimentos para os menos favorecidos e outras utilizaram os meios tecnológicos disponíveis para a produzir máscaras ou álcool em gel 70. Ato digno de louvor indubitavelmente. Mas, em contrapartida a maioria das universidades e dos institutos científicos de pesquisa se mantiveram (e ainda se mantém) em “lockdown” permitindo que seus professores e pesquisadores fiquem resguardados em suas casas. Diferentemente da grande maioria do pessoal das tecnologias que está pensando soluções, pondo a cara para bater, e descartando imediatamente possibilidades que se mostram ineficientes.
O mundo das tecnologias é o das possibilidades e não o da certeza que é próprio da ciência. As tecnologias permitem manter o mundo rodando cada vez melhor, é inovador e disruptivo por natureza e não se permite forçar continuidades por regimento. Não está mais dando certo uma dada tecnologia, testam-se outras simultaneamente até encontrar aquela que seja melhor e que tenha, inevitavelmente, valor agregado.
O mundo há muito tempo é volátil, incerto, complexo e ambíguo. Não há muita certeza do vai acontecer daqui a alguns segundos. O planejamento sistêmico tornou-se muito difícil e apenas incerto. A complexidade é permanente, enorme e aumenta intensamente dia após dia. Solução alguma é simples ou única e sempre está em uma enorme cadeia de complexidades.
Volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade (sintetizada no acrônico VUCA) são quatro características do momento que não podem ser deixadas de se considerar para a humanidade seguir em desenvolvimento. Mas, são, também, características que não vivem bem no campo da pesquisa científica.
Para se prosperar neste mundo VUCA são necessárias algumas competências necessárias tais como resiliência para lidar com as inevitáveis mudanças; flexibilidade para lidar com cenários imprevisíveis ou imprecisos; multidisciplinariedade para se enxergar soluções eficazes; e, plena abertura para escolher soluções e saber arcar com os erros cometidos e agilmente resolvê-los.
Cada vez mais o mundo é jovem, é digital, é disruptivo e inovador, pois o futuro é agora, não há nada de novo para ser perpetuado no amanhã sendo a mudança constante (permanente) a necessidade determinante.
Sistemas de diferentes magnitudes morrerem a cada hora porque insistem em fazer o mesmo durante todo tempo. O mundo disruptivo exige um olhar diferente de futuro que é determinante para se viver o presente no qual as mudanças vão acontecendo cada vez mais rápidas e de diferentes formas.
Neste mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo o futuro se confunde com o presente e como não é igualmente distribuído aumenta mais ainda as desigualdades deixando para trás todo aquele que não entende que decisões tomadas ontem podem e devem ser revistas hoje para promover não apenas impactos amanhã, mas para mudar radicalmente o próprio hoje.
Aquela concepção de que algo podia ser para sempre não tem mais sentido, pois tudo muda a toda hora. É a disrupção o normal pós pandemia de Covid-19. Não existe a menor possibilidade de se manter aquele “normal” de ontem, pois hoje o mundo híbrido real/cyber físico não permite o retrocesso ao passado de ontem mesmo que se insista.
Ao descobrir e se convencer que o mundo é quântico descobrem-se outras múltiplas necessidades que levam a infinitas soluções. Mas, por imediata consequência novas habilidades e capacidades são exigidas a cada novo instante.
Embora neste mundo VUCA os robôs humanoides e os humanos digitais se avolumem tomando conta da maioria dos trabalhos humanos surgem, em contrapartida, a necessidade de se desenvolver a inteligência emocional, a resiliência, a colaboração, o autocontrole, o contínuo aprender para apreender e outras tantas capacidades que somente o ser humano pode desenvolver.
No mundo VUCA, disruptivo e inovador, onde literalmente o homem está disputando espaço com as máquinas inteligentes dotadas de inteligência artificial que cada vez se especializa o homem tem que desenvolver, também, a criatividade, a capacidade de resolver problemas cada vez mais complexos, o pensamento crítico, primando por melhorar, cada vez mais, sua flexibilidade cognitiva e sua maneira de lidar adequadamente com pessoas tanto no trato pessoal quanto na gestão e coordenação.
As próprias organizações já começaram a entender que competir é situação prejudicial ao próprio desenvolvimento. A união ou simples troca de expertises e “Know-how” de todos é fundamental para evoluir ou para não deixar de existir. Cooperação em associação com a mudança é a bola da vez para garantir resultados cada vez mais elevados e constantes.
A ideia de se conseguir vantagens competitivas para se manter liderando é olhar para o futuro com lentes já gastas do passado que embotam as estratégias para se manter no mundo disruptivo, inovador, cada vez mais complexo e com infinitas possibilidades.
Aprender, desaprender e reaprender muito rapidamente é a nova expertise que o mundo passa a exigir dos profissionais, pois toda hora o conhecimento muda e efetivamente acabou aquela de que um profissional é insubstituível. Os homens estão sendo trocados por robôs cada vez melhores e mais baratos no nível operacional.
Organizações que guardam segredos, não permitem trocas de conhecimentos entre profissionais e se mantém achando que continuarão a dar certo porque sempre foi assim vão quebrar e vão levar junto, possivelmente, toda uma rede de colaboradores que compactuam com os mesmos preceitos. Não aconteceu uma parada no normal de antes. Não existe mais o normal de antes e nem tão pouco será possível reproduzi-lo na sequência.
O futuro (que já estava no presente daquele normal de antes) foi ainda mais acelerado e tornado visível. As necessidades de mitigação dos danos da pandemia exigiram novas formas de cooperação e passou a contar com a necessidade de maior confiança no gerenciar quaisquer atividades. Manter os mesmos padrões passou a ser um erro que se descobriu não traz mais vantagens e que impedem quaisquer possibilidades de flexibilização.
Atualmente a cada 12 (doze) horas o conhecimento no mundo dobra em quantidade. Assim, seguir o tempo da ciência, das universidades, dos institutos científicos não é mais possível. A ciência produzida ao longo de dois a seis anos (em média) nos cursos de mestrado ou de doutorado não dá mais. A evolução do conhecimento não permite esperar mais esta “eternidade” que demora hoje o meio acadêmico para se fazer ciência. Apresentar em teses ou dissertações resultados para problemas identificados lá no passado somente servirão para contar história.
De outro lado, mudança é algo, também, que a ciência não entende (ou não aceita) e por não ter correspondente entendimento se mostra tão resistente aos relacionamentos necessários com as tecnologias que respiram mudança e se enquadram muito simplesmente no mundo VUCA.
O cenário mundial sinaliza claramente o não mais aceitar determinados posicionamentos já compreendidos como ultrapassados e que só contribuem para danos contínuos na vida das pessoas se mantidos.
Numa avaliação simplória, se o conhecimento dobra em 12 horas, então em um mesmo dia tem-se duas realidades bem diferentes ditadas pelas mudanças de forma que, por exemplo, um problema apesentado no início da madrugada de um dado dia poderá não ser mais um problema pouco depois do meio-dia daquele mesmo dia.
Assim, para que a ciência retome sua imprescindível função na vida das pessoas e não mais possa continuar a falhar com a vida deverá entender, ou se permitir iniciar a compreender, que a realidade é disruptiva, tem na inovação e na mudança sua nova razão para evoluir.
Carlos Magno Corrêa Dias é professor, pesquisador, conselheiro efetivo do Conselho das Mil Cabeças da CNTU, conselheiro sênior do Conselho Paranaense de Cidadania Empresarial (CPCE) do Sistema Fiep, líder/fundador do Grupo de Pesquisa em Desenvolvimento Tecnológico e Científico em Engenharia e na Indústria (GPDTCEI), líder/fundador do Grupo de Pesquisa em Lógica e Filosofia da Ciência (GPLFC), personalidade empreendedora do Estado do Paraná pela Assembleia Legislativa do Estado do Paraná (Alep).