O governo federal enviou ao Congresso, na forma da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/2020, seus planos para a reforma administrativa. O pacote completo das mudanças pretendidas, conforme anunciado, terá mais duas fases que incluirão vários projetos de lei detalhando aspectos relativos à carreira e às relações de trabalho do servidor público.
Como tem acontecido nos últimos anos com medidas prejudiciais aos trabalhadores, a proposta é anunciada como essencial às contas públicas e à eficiência econômica. Também a exemplo de casos anteriores, notadamente as reformas trabalhista e previdenciária, a promessa deve ser converter em nova falácia. Para Antônio Augusto de Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar, o Toninho do Diap, o resultado agora será “desorganizar o serviço público, punir os atuais servidores e submeter os futuros a regras draconianas de relações de trabalho”.
Entre os argumentos para a reforma, alega-se o excesso de gastos com os trabalhadores do Estado. “Essa é uma campanha desonesta de desqualificar o servidor a partir de casos isolados. O salário médio é de R$ 3.800,00, portanto baixo”, afirma Toninho. A indignação do analista é justificada quando se observam os números disponíveis em levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Aproximadamente 53% ganham até quatro salários mínimos. Ou seja, bem distante da ideia de altas remunerações que não serão tocadas pela reforma, já que essa não diz respeito ao alto escalão da burocracia estatal, como a magistratura, por exemplo.
Além disso, quase 40% de todos os servidores no Brasil atuam na saúde e na educação, áreas absolutamente essenciais, que demandam qualificação, melhores salários e condições de trabalho, em vez de precarização. Esse quadro remete ao fato de a ameaça representada pela reforma não se limitar ao contingente do funcionalismo. Isso porque a PEC inclui entre os princípios da administração pública o da subsidiariedade. Ou seja, incentiva-se a privatização dos serviços, e o Estado passa a atuar apenas como linha auxiliar, onde o mercado não tiver condição ou interesse de atender às demandas. Para tanto, seria incluído um novo artigo na Constituição autorizando a formalização de instrumentos de cooperação.
Essa lógica subverte o papel do Estado e vai na contramão das evidências verificadas neste momento no País ao olharmos para a emblemática questão da pandemia do novo coronavírus.
Embora tenhamos ultrapassado a trágica marca dos 150 mil mortos no Brasil, a situação só não é pior porque temos um Sistema Único de Saúde (SUS) que garante atendimento universal, apesar do seu subfinanciamento e das insuficiências diversas. Nossas expectativas de uma ou mais vacinas que nos livrem do risco de contaminação residem em centros públicos de pesquisa como Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e Instituto Butantan e no Programa Nacional de Imunização. Ou seja, é o setor público que atua efetivamente em questões vitais.
É preciso que o Estado ganhe eficiência para cumprir suas funções e não abandone suas obrigações. Assim, é urgente e fundamental o debate responsável sobre a reforma administrativa e suas consequências caso seja aprovada na forma proposta. Estejamos atentos para evitar o que pode ser mais uma tragédia social no País.
Murilo Pinheiro
Presidente FNE
FONTE: FNE